Que Jair Messias Bolsonaro é dado a golpismos, isso se sabe desde que ele era um obscuro deputado vivendo nas sombras limítrofes do baixo clero da Câmara. Basta ler qualquer declaração dele dada nas três décadas em que habitou naquele mundo de rachadinhas e migalhas do grande butim das lideranças.

Presidente, o capitão (reformado para evitar a expulsão por indisciplina do Exército) deu sinais crescentes acerca de suas intenções, em especial após o “test-drive” do primeiro ano no cargo.

A pandemia e seu embate com os estados acerca do manejo sanitário lhe deram campo fértil para exercitar autoritarismos, ainda que de forma ritmada.

Para complicar o cenário, oficiais-generais das três Forças têm ojeriza ao ora líder da corrida eleitoral, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e não viram emergir uma terceira via viável. Se um episódio como o do tuíte de 2018 ou uma ruptura pareçam distantes, não é imaginária a má vontade fardada com o ex-presidente.

Isolado, o Judiciário está na defensiva, apesar de reuniões aqui e ali para tentar mostrar normalidade.

A live de Bolsonaro nesta quinta-feira (5) acabou de desenhar o golpe dos sonhos do presidente. Ele disse que seu partido, o PL, irá contratar uma auditoria externa para, em talvez 40 dias, dizer se as urnas eletrônicas são seguras.

Isso é uma afronta bizarra ao edifício da eleição, não menos porque dinheiro público será usado para tal empreitada, numa semana que começou com o presidente em atos contra o Supremo.

É evidente que a espuma servirá para deixar as redes sociais alertas e, assim como caso das “provas” (aspas compulsórias) de que Bolsonaro teria ganho no primeiro turno de 2018 que nunca foram mostradas, quando ela espraiar não haverá substância alguma.

Chama a atenção a presença ativa do centrão no processo, também. Assim como os militares, a relação de cooptação com o presidente sempre foi de duas mãos. PL, PP e afins sempre trataram a ocupação do governo e a transferência do real poder para o esquema de emendas opacas em curso como uma vitória final.

Afinal, ganhe Bolsonaro ou Lula, diz o ditado, o centrão estará com o vencedor ao fim.

Mas a associação direta com um arranjo que como consequência última pode significar a impugnação dos votos dos seus próprios membros só insinua duas coisas: participação num esquema golpista ou a crença de que é só barulho eleitoral inócuo.

Nenhuma das duas opções é aceitável, institucionalmente. Usando o roteiro deixado por seu ídolo Donald Trump na invasão do Capitólio de 2021, Bolsonaro pode não conseguir dar um golpe por falta de capacidade operacional, mas a crise está garantida

Fonte: Folha de São Paulo

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